Primavera, fins de semana prolongados, Portugal… Um clássico. Começa a temporada de excursões ao outro lado da fronteira. Nessa viagem, podemos usar o espanhol porque nossos vizinhos o entendem, mas devemos ser avisados para não fazer besteira. Os falsos amigos, aquelas palavras com significados muito diferentes, mas fonéticas semelhantes, estão na mira dos espanhóis e em Portugal mais do que em qualquer outro país.
Quase todos nós conhecemos o jogo de mal-entendidos causado pelos adjetivos ‘requintado’ e ‘terrível’. Sabe, você come um bacalhau com natas e, ao terminar, exclama com satisfação que está uma delícia e diz ao garçom, que, se tiver experiência com o espanhol, entenderá que você está elogiando o bacalhau, mas se estiver novo ou o restaurante fica longe da fronteira, vai preocupar-se e informar o chef que naquela mesa descrevem o seu bacalhau como estranho e excêntrico. Então, se você gosta desse bacalhau, melhor usar o adjetivo horrível. Os seus companheiros de mesa vão ficar surpreendidos, mas o empregado de mesa vai perceber que é um bacalhau óptimo, fantástico… Aliás, o bacalhau com natas não tem natas, mas bechamel.
Existe uma palavra, constipado, que em francês e português significa constipado, nunca resfriado. É difícil errarmos em francês porque se diz ‘constipé’, mas se entrares numa farmácia portuguesa, cuidado com os constipados, não vão receitar um laxante. E se você for a um oftalmologista, não fale sobre lentes de contato porque eles vão te mandar para o supermercado. Lá, as ‘lentilhas’ são lentilhas.
Continuando com o mundo particular da hospitalidade, lembre-se que em bares você deve pedir um ‘floco’ de água, os ‘copos’ (potes) são melhores para o kalimocho. A ‘marmelada’ é marmelada, o cachorro-quente é um ‘cachorrinho’ e a cerveja é um ‘fino’. Do outro lado da fronteira, a salsa chama-se ‘salsa’, as vieiras de porco são ‘febras’, vão acrescentar ‘azeite’ com zeta à salada porque ‘óleo’ significa aceite e ‘bolacha’ é a bolacha, mas o ‘ galheta’ é o vinagre.
Contam o caso de um diplomata espanhol que chegou ao Porto a morrer de fome e ofereceu-lhe uma ‘francesinha’. O diplomata sorriu, agradeceu a cortesia e sugeriu à francesa que parasse depois do almoço. Os empregados não entenderam nada, mas serviram-lhe uma espécie de sandes nadando em caldo e recheada com carne, queijo, ovo… Ou seja, uma ‘francesinha’.
Ao viajar, se no aeroporto pedirem para você abrir a mala ‘ruim’, não se preocupe, eles querem dizer a mala. E se o hotel mandar você para o quinto andar, não pense que você tem que subir cinco andares. Em Portugal, um andar de um edifício é um ‘passeio’. E se a recepcionista anuncia que vão ‘flertar’ com ele ao telefone, ele esfria o tesão: não é uma linha erótica, mas uma simples ligação para acordá-lo.
A lista de falsos amigos é interminável: um ‘agasalho’ não é um presente, mas um casaco; uma ‘anedota’ é uma piada; o ‘balcão’ não é uma varanda, mas um balcão ou um balcão de bar; a ‘pompa’ é um boato; uma ‘conquista’ é uma ilusão; ‘morro’ é morro; ‘pila’ é um pênis e os ‘marujos’ não são os fofoqueiros, mas os marinheiros. Mas se você é muito preguiçoso (‘sorna’) para tentar tanto não cair em ‘armadilhas’ (excrementos), fale apenas espanhol. Eles nos entendem.
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