Portugal conseguiu superar a crise económica, reduzir o desemprego e modernizar-se, mas não consegue enfrentar a depressão, que todos os anos ceifa mil vidas. E você tem uma região que se tornou a capital mundial do suicídio.
Portugal conseguiu ultrapassar a crise económica, reduzir o desemprego e modernizar-se, mas o chamado “milagre português” não conseguiu fazer face a uma doença que pesa muito: depressão, uma “epidemia silenciosa” que ceifa mil vidas a cada ano.
“A depressão em Portugal tem características epidémicas, é uma epidemia silenciosa”, reconhece o ministro da Saúde português, Adalberto Campos Fernandes.
“Temos muito trabalho pela frente”, admite Campos, que trabalhou como médico antes de assumir a pasta da Saúde no governo do socialista António Costa.
Talvez por isso, o ministro prefira não especular sobre as raízes de um problema que, destaca, “é diferente de um ponto do país para outro”.
Na região do Alentejo, onde tradicionalmente se regista maior taxa de suicídio do país a doença está relacionada isolamento, pobreza, envelhecimento e com aspectos de natureza familiar.
Esta região, que concentra apenas 7% dos portugueses, tem uma zona particular, Odemira, que Tornou-se a capital do suicídio do mundo. É o município com a maior taxa de suicídio do planeta. São registrados 61 casos por 100.000 habitantes.
As estatísticas revelam que as áreas rurais são as mais atingidas, e jovens e maiores de 65 anos, os mais propensos a tirar a própria vida.
O consumo de antidepressivos (no ano passado os portugueses adquiriram 20 milhões de psicotrópicos nos quais gastaram cerca de 250 milhões de dólares), não se traduziu numa alteração significativa dos números.
A ministra da Saúde reconhece que, embora Portugal se possa gabar do trabalho que tem feito em áreas como o tratamento do HIV ou da hepatite, “na saúde mental temos muito trabalho pela frente” e é “uma prioridade para o Sistema Nacional de Saúde”.
O problema é especialmente complexo porque, destaca Campos, “não há padrão” que defina as razões das altas taxas de suicídio no país, com uma média anual próxima a mil vítimas.
Um estudo recente de especialistas da Universidade de Coimbra concluiu que, entre 1980 e 2015 31.000 mortes “auto-infligidas” foram registradas, com maior incidência na zona rural.
Bebidas alcoólicas mais caras, mais barreiras de proteção em pontes e outros locais perigosos e mais apoio aos desempregados foram as três principais medidas do plano nacional de prevenção do suicídio 2013-2017 de Portugal. Pretendia-se reduzir este tipo de óbitos que em Portugal supera a dos mortos em acidentes de trânsito.
O assunto tem chamado a atenção de intelectuais, escritores e artistas há décadas, que refletiram de mil maneiras sobre a depressão e a morte.
O fado “Sad Luck” descreve bem a intensidade deste sentimento: “Ando na vida em busca/ de uma noite menos escura/ que traga a luz da lua/ de uma noite menos fria/ em que não sinta agonia/ de outro dia que morreu“.
Em “Pessimismo Nacional”, o médico e escritor Manuel Laranjeira mostra uma visão depressiva de Portugal, em sintonia com a própria história do autor, que suicidou-se em 1912.
Laranjeira era amigo do espanhol Miguel de Unanumo, que em 1908 escreveu o ensaio “Portugal, uma cidade suicida”no volume “Pelas terras de Portugal e Espanha”.
Agora, uma editora resgatou os dois ensaios e acaba de publicá-los em uma única edição sobre a psicologia coletiva do país.
“Portugal é um povo triste mesmo quando sorri”, escreveu Unamuno em 1908.
No entanto, o escritor espanhol rendeu-se ao país que definiu como “uma menina bonita e doce” que, de volta à Europa, observa “como o sol se põe nas águas infinitas”.
“O que terá este Portugal para me atrair? O que terá esta terra, por fora, risonha e suave, por dentro atormentada e trágica? Não sei, mas quanto mais vou a ela, mais quero voltar”, confessou.
Agência EFE.
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