Publicado o primeiro mapa macrogenético global das espécies que compõem os habitats marinhos

As espécies conhecidas por formarem habitats marinhos (gorgónias, corais, algas, fanerógamas marinhas, etc.) são organismos que ajudam a gerar e estruturar paisagens subaquáticas. São um refúgio natural para outras espécies, contribuindo com biomassa e complexidade para o fundo do mar. Mas essas espécies-chave nos ecossistemas marinhos estão atualmente sob ameaça das mudanças climáticas globais e outras perturbações da atividade humana.

Agora, um estudo, no qual foi elaborado o primeiro mapa macrogenético global das espécies que compõem os habitats marinhos, alerta que mesmo em áreas marinhas protegidas não se protege a diversidade genética das espécies estruturais, embora isso seja essencial para a adaptação dos populações a mudanças que alteram o ambiente natural.

O estudo é obra de Laura Figuerola-Ferrando, Cristina Linares, Ignasi Montero-Serra e Marta Pagès-Escolà, da Faculdade de Biologia da Universidade de Barcelona (UB) e do Instituto de Pesquisa em Biodiversidade da UB (IRBio); Jean-Baptiste Ledoux e Aldo Barreiro, do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) de Portugal, e Joaquim Garrabou, do Instituto de Ciências do Mar (ICM) anexo ao Conselho Superior de Investigação Científica (CSIC) de Espanha.

A diversidade genética também é um componente da biodiversidade

Tradicionalmente, os planos de manejo e conservação da biodiversidade marinha têm considerado fatores como a riqueza de espécies. A diversidade genética —outro componente principal da biodiversidade— reflete a variedade genética que existe entre organismos da mesma espécie e é um fator determinante na capacidade adaptativa das populações e sua sobrevivência. Apesar de sua importância, a diversidade genética até agora foi ignorada nos planos de manejo e conservação.

“A diversidade genética desempenha um papel fundamental na promoção de uma maior capacidade de espécies, populações e comunidades de se adaptarem às rápidas mudanças ambientais derivadas das mudanças climáticas e, assim, aumentarem sua resiliência”, detalha a pesquisadora Laura Figuerola-Ferrando.

“No entanto, até agora a grande maioria das áreas marinhas protegidas são implementadas com base na presença de várias espécies e habitats, sem ter em conta a sua diversidade genética. Outro exemplo seria a lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), que também não contempla a diversidade genética», acrescenta.

Nos últimos anos, a necessidade de ampliar os esforços de conservação para proteger a diversidade genética está sendo reforçada. “O progresso tecnológico no desenvolvimento maciço de diferentes técnicas para determinar a diversidade genética (por exemplo, através do uso de microssatélites ou pequenos fragmentos de DNA), bem como seu custo acessível, pode ajudar a incluir a diversidade genética nos planos de manejo e conservação”, detalha a pesquisadora do Departamento de Biologia Evolutiva, Ecologia e Ciências Ambientais da UB.

A pesquisa destaca a relevância de incluir a diversidade genética nos planos de conservação e manejo da vida marinha. (Foto: Grupo de Pesquisa MedRecover. CC POR)

Do Atlântico Noroeste ao Golfo da Guiné

O novo estudo aplica técnicas macrogenéticas para identificar padrões genéticos gerais em várias espécies marinhas em grandes escalas espaciais. Os autores analisaram dados de um banco de dados global contendo informações sobre a diversidade genética (baseada em microssatélites) de mais de 9.300 populações de 140 espécies em diferentes regiões marinhas do planeta.

Os resultados traçam um cenário de referência de padrões genéticos em espécies formadoras de habitats marinhos (corais, macroalgas, fanerógamas marinhas, etc.) de potencial interesse para a melhoria dos planos de manejo e conservação da vida marinha.

O Atlântico Noroeste e a Baía de Bengala são as regiões onde se identificou a maior diversidade genética em espécies formadoras de habitats marinhos. Valores bastante elevados (acima da média global) também foram identificados no Mediterrâneo. Inversamente, as áreas marinhas com os valores mais baixos de diversidade genética são o Golfo da Guiné e o Atlântico Sudoeste.

As descobertas também indicam uma correlação positiva entre a diversidade genética e a riqueza de espécies de espécies animais e vegetais formadoras de habitats marinhos. No entanto, o trabalho alerta para um resultado preocupante: a Rede de Áreas Marinhas Protegidas (RAMP) nas grandes ecorregiões oceânicas não preserva áreas em que a diversidade genética de espécies formadoras de habitats marinhos é maior.

“O que vimos é que o que não está sendo protegido nas áreas marinhas protegidas é a diversidade genética. No estudo, a hipótese inicial sugeria que haveria maior diversidade genética nessas áreas, mas não foi o que aconteceu. De facto, a nível global temos visto que não existem diferenças na diversidade genética entre o interior e o exterior das áreas marinhas protegidas”, explica Laura Figuerola-Ferrando, que desenvolve a sua tese de doutoramento sob a orientação de Cristina Linares (UB) e Joaquim Garrabou (ICM).

Um novo padrão de biodiversidade

Os autores do estudo também identificaram um padrão específico na distribuição da diversidade genética das espécies formadoras de habitats marinhos que difere dos modelos tradicionais conhecidos até agora. “Este é um padrão latitudinal bimodal: é um modelo biogeográfico complexo e implica que, se modelarmos como a diversidade genética dessas espécies varia com a latitude, encontramos dois picos em zonas temperadas e uma pequena queda na diversidade genética no equador, ” detalha a professora Cristina Linares (UB-IRBio), uma das coordenadoras do estudo junto com Jean-Baptiste Ledoux (CIIMAR).

Essa descoberta científica é relevante porque até algumas décadas atrás se considerava que a distribuição da biodiversidade no planeta seguia um padrão unimodal, ou seja, tinha valores máximos no equador e decrescia em direção aos polos. “Nem sempre é assim, especialmente em termos de diversidade de espécies nos ecossistemas marinhos. Por exemplo, no caso das espécies bentônicas, esse padrão é mais bimodal do que unimodal tanto em riqueza de espécies quanto em diversidade genética”, explica Cristina Linares.

“Em nosso estudo, o padrão latitudinal bimodal é influenciado pela taxonomia: no modelo utilizado, encontramos diferenças estatisticamente significativas entre espécies animais (maior diversidade genética) e vegetais (menor diversidade genética). Além disso, se explorarmos o padrão latitudinal que separa as espécies de animais e plantas, veremos como continua a observar-se um padrão bimodal nos animais, enquanto o mesmo não se pode dizer das plantas”, acrescenta o investigador Jean-Baptiste Ledoux ( CIIMAR ).

As conclusões do trabalho lembram a necessidade de incluir a diversidade genética das populações nos planos de manejo e conservação da biodiversidade do planeta.

Este trabalho revela ainda que as regiões mediterrânica e atlântica estão entre as mais presentes na bibliografia científica utilizada neste trabalho sobre os padrões macrogenéticos das espécies estruturais dos fundos marinhos.

O estudo intitula-se “Padrões globais e condutores da diversidade genética entre as espécies formadoras de habitats marinhos”. E foi publicado na revista acadêmica Global Ecology and Biogeography. (Fonte: UB)

Eloise Schuman

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