Guadalajara (México), 8 de junho (EFE).- O diretor espanhol Estibaliz Urresola Solaguren criticou nesta quinta-feira no México o “adultocentrismo” que envolve a questão da infância trans por supor que um menor não tem capacidade de decidir e reconhecer quem é.
“Tem muito centrismo adulto nessa frase, (pensar que) nós adultos sabemos o que é ser mulher, o que é ser homem. Sabemos quem tem o direito de dizer e quem não tem, e não sei, ainda não temos que entender tudo, só precisamos respeitar algumas questões”, disse em entrevista à EFE durante sua participação no a 38ª Edição do Festival Internacional de Cinema de Guadalajara (FICG),
Urresola apresentou seu mais recente filme de ficção “20.000 espécies de abelhas” no festival mexicano, que integrou as galas beneficentes e no qual aborda como um menino de oito anos inicia seu processo de identidade como menina e o trânsito que tem diante de uma família e de uma sociedade em que impera o binarismo.
“Quando uma menina cisgênero se expressa, aos 4 ou 7 anos, como menina, ninguém a questiona ou se ela sabe o que é ser menina, e ainda, se fizermos isso com infâncias trans, não, ( diz-se) é demais. Jovens, como pode saber, eles não têm maturidade psicológica para saber quem são, mas esse sentimento vem de um lugar que é um mistério e muitas vezes vem com uma clareza muito contundente”, expressou o diretor.
O filme basco, que estreou em abril na Espanha, conquistou prêmios como o Urso de Prata de melhor ator principal no Festival de Berlim e o Biznaga de Ouro no Festival de Málaga, de melhor filme e Melhor Atriz Elenco.
APOIO FUNDAMENTAL
Em 2018, Ekai, um adolescente transgênero de 16 anos, suicidou-se em sua casa em Ondarroa (Espanha), motivado por problemas para reconhecer sua identidade e por não conseguir um tratamento hormonal para retardar seu processo de desenvolvimento.
O caso emocionou a diretora que escreveu o roteiro de “20.000 espécies de abelhas”, quinto filme da carreira, com a intenção de levar uma mensagem de esperança às crianças e famílias que estão passando por esse processo.
“Ekai deixou uma carta e nela vislumbrou um futuro mais esperançoso para aqueles que vieram depois dele e ele teve a sensação de querer fazer aquele filme, que se conectaria com aquele momento em 2018, por isso também aquele filme com um espírito diferente, mais brilhante, esperançoso.
Depois de trabalhar com a Associação de Familiares de Menores Trans do País Basco, com a qual pôde conhecer a história de dezenas de meninas e meninos que tiveram um processo de identidade de gênero e que lhe contaram o que pensavam sobre essa transição.
Urresola defendeu que as meninas e meninos que estão nesse processo sejam acompanhados por adultos que respeitem as emoções que estão sentindo e os estimulem a serem eles mesmos.
“Respeite a pessoa à nossa frente e observe como ela se sente quando tem um espaço para se expressar livremente e quando não tem. E diante dessas evidências, veja como os níveis de ansiedade dessa pessoa relaxam, como ela começa a desenvolver outras questões que não necessariamente estão ligadas à identidade, mas a desejos, gostos e paixões”, afirmou.
Considerou que nesta transição a família é fundamental não só para acompanhar a menina ou o menino, mas também porque se gera uma mudança na forma como as outras pessoas veem estas crianças.
“Tudo isso levou muitas famílias a um lugar de maior escuta e outra compreensão do outro e do outro e de maior reconhecimento mútuo. E também, por outro lado, essa ideia de que o trânsito não foi tanto o que esses meninos e meninas fizeram, mas sim que se algo mudou foi o olhar dos outros para esses meninos e meninas”, apontou.
O filme vai continuar o seu circuito noutros festivais como Bolonha, Israel e Helsínquia e também no Curtas Vila do Conde em Portugal, onde haverá uma retrospetiva dos filmes do realizador.
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