Na África do Sul, um cantinho de Portugal há gerações

Península do Cabo, em 25 de maio de 2010. Foi atravessada em 1488 pelo explorador português Bartolomeu Dias

O garçom coloca os pratos de camarão em uma mesa no charmoso restaurante familiar à moda antiga, onde proprietários e clientes conversam em português no subúrbio de Joanesburgo.

A África do Sul é o lar de uma das maiores comunidades portuguesas do continente africano.

Glória da Cunha, 54 anos, sucedeu ao pai e ao tio na chefia do Parreirinha Restaurante. Ambos deixaram Portugal rumo à África do Sul no final da década de 1960.

O negócio, com as paredes cobertas de notas de vários países e onde pendem do tecto milhares de gravatas, serve iguarias à comunidade portuguesa “há pelo menos três gerações”, disse à AFP o patrono.

Cerca de 200 mil portugueses e cerca de 500 mil sul-africanos de origem portuguesa residem no país, que faz fronteira com Moçambique e próximo de Angola, duas ex-colónias portuguesas, segundo dados do governo sul-africano.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, escolheu este ano a África do Sul para a sua tradicional visita oficial ao estrangeiro na semana do feriado nacional. E será recebido na terça-feira pelo seu homólogo sul-africano Cyril Ramaphosa.

Os portugueses “chegaram aos poucos desde o final do século 19 até a década de 1950”, disse à AFP Clive Glaser, historiador da Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo.

Os primeiros imigrantes, muitos dos quais chegaram ilegalmente, eram maioritariamente habitantes da ilha da Madeira “que embarcaram num barco para tentar a sorte”, acrescenta o especialista. Uma força de trabalho que não falava inglês e que o governo sul-africano na altura “não estava muito entusiasmado em receber”, sublinhou.

– Ondas sucessivas –

Seguiu-se depois uma segunda vaga de trabalhadores qualificados, a dos pais da Sra. da Cunha, e depois vieram os “refugiados coloniais” que fugiram de Moçambique e de Angola à medida que conquistavam a independência em 1975.

Os lusófonos são “hoje o terceiro maior grupo de brancos sul-africanos, depois dos africâneres e dos ingleses”, sublinha Glaser.

Os madeirenses, os portugueses, os moçambicanos e os angolanos sempre fizeram uma banda separada antes de se integrarem mais uns com os outros.

Mas “a comunidade é muito discreta”, diz Manny Ferreirinha, 68 anos, presidente do South African Portuguese Forum, presente num festival cultural em Joanesburgo.

Entre duas dentadas de Travesseiros de Sintra, um pastel com amêndoas, ou pastel de nata, um típico pudim cremoso que hoje se encontra por toda a África do Sul, os recorrentes apagões e crimes recordes alimentam as conversas.

A ponto de alguns festivaleiros inquiridos pela AFP ponderarem deixar a maior potência industrial do continente para regressar a Portugal.

Segundo Glória da Cunha, que gere o restaurante com os irmãos, há uma situação de inadimplência que afeta os negócios e por isso muitas famílias se mudaram nos últimos anos.

O bairro onde historicamente se concentram os imigrantes portugueses, a sul da capital económica, tem vindo a degradar-se ao longo dos anos. Segurança também. E os clientes estão cada vez mais relutantes em vir aqui.

“É triste. Cresci aqui, este prédio tem história, memórias”, diz.

“A comunidade portuguesa está em declínio na África do Sul”, diz Glaser, que afirma que o movimento de regresso à pátria começou com a adesão de Portugal à UE em 1986.

Nascido na África do Sul, Manny Ferreirinha, porém, diz que nunca mais sairá de lá, porque se sente em casa nesta parte da África.

zam/cld/ger/emd/eg/zm

Raven Carlson

"Viciado em bacon apaixonado. Ninja orgulhoso da cultura pop. Analista irritantemente humilde. Entusiasta de TV. Fã de viagens ao longo da vida."

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *