Em visita a Portugal, Lula garante que não igualou responsabilidades de Rússia e Ucrânia na guerra

O Presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva disse hoje em Lisboa que nunca igualou a Rússia e a Ucrânia em termos de responsabilidade pela guerra entre os dois países, e insistiu na necessidade de uma paz “negociada” no conflito, enquanto inicia uma visita a Portugal em que o seu homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa, manifestou a sua discrepância com uma iniciativa que poderia “beneficiar o infractor”.

Lula, que busca colocar o Brasil no centro da diplomacia mundial, foi enfático ao condenar a invasão russa à Ucrânia e voltou a defender sua iniciativa de paz, depois que Europa e Estados Unidos repudiaram as declarações feitas por ele ao encerrar sua visita à China, onde criticou o apoio de armas dos aliados ocidentais a Kiev.

“Nunca vou igualar os dois países, porque sei o que é invasão e o que é integridade territorial. Todos nós pensamos que a Rússia cometeu um erro e já o condenamos em todas as nossas decisões na ONU. Mas acho que a guerra já começou, a guerra deve parar agora. E, para parar a guerra, tem de haver alguém com quem falar”, disse Lula em conferência de imprensa com o Presidente português, com quem se reuniu este sábado, informou a Presidência brasileira.

Lula está desde ontem na capital portuguesa para uma visita de Estado de quatro dias, no âmbito de um périplo europeu, o primeiro desde que tomou posse em Janeiro, e que permitirá aos dois países assinar mais de uma dezena de acordos.

O líder do Partido dos Trabalhadores (PT) disse que o Brasil sempre condenou os russos pela “ocupação” do território ucraniano e ressaltou que não tem intenção de visitar nenhuma das duas nações no momento.

“Ao mesmo tempo que meu governo condena a violação da integridade territorial da Ucrânia, defende uma solução política negociada para o conflito”, declarou e sentenciou: “Precisamos urgentemente de um grupo de países que se sente para negociar tanto com a Ucrânia e a Rússia para buscar a paz”.

Apesar do desejo de diálogo de Lula, seu homólogo português se distanciou da posição defendida por Brasília.

“A posição de Portugal é diferente”, retrucou rapidamente o presidente deste país membro da União Europeia (UE) e da NATO, um dos primeiros a fornecer tanques de guerra a Kiev.

“O presidente Lula acredita que o caminho para uma paz justa e duradoura passa por priorizar o caminho da negociação”, disse Rebelo de Sousa, antigo aliado do PT, que teve uma relação tensa com o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro (2019-2022). .

Mas “a posição portuguesa é diferente: sustenta que um eventual caminho para a paz pressupõe o direito prévio da Ucrânia de reagir à invasão, recuperando o que pode ou quer recuperar (…) da sua integridade territorial”, afirmou, segundo a agência de notícias AFP.

E isso se deve a “uma questão de princípio, que não é para beneficiar o infrator”, concluiu.

A viagem de Lula à ex-potência colonial da qual o Brasil conquistou a independência em 1822 ocorre quatro dias após seu retorno da China, país que desde 2009 é o principal parceiro comercial do Brasil e no qual Lula aposta para liderar uma espécie de clube das nações pela paz na Ucrânia.

Ao final de sua visita ao gigante asiático, Lula reclamou que “a Europa e os EUA (como membros da OTAN) acabam contribuindo para a continuação dessa guerra na Ucrânia”, ao que a Casa Branca respondeu que o brasileiro “está reproduzindo Propaganda russa e chinesa”.

Peter Stano, porta-voz de relações exteriores da UE, enfatizou que “os EUA e a UE estão trabalhando juntos como parceiros na ajuda internacional, ajudando a Ucrânia com exercícios de autodefesa contra a invasão russa”.

Em Portugal, a ambiguidade de Brasília também não impressionou.

“A posição do Brasil nas Nações Unidas sempre foi a mesma: ao lado de Portugal, dos Estados Unidos e da OTAN. (…) Dito isso, é muito simples: se o Brasil mudar de posição, isso não é problema de Portugal, isso ele vai manter a sua posição”, declarou o presidente português no início desta semana.

O governo brasileiro afirmou em comunicado que “está determinado a contribuir para a promoção do diálogo e da paz e para o fim deste conflito”.

Lula garantiu que, embora tenha sido convidado pelos ucranianos, não tem intenção de ir a Kiev. “Não estive na Rússia e não vou para a Ucrânia. Só irei quando houver uma possibilidade real de um clima de construção da paz”, afirmou.

No entanto, ele confirmou que enviará o ex-chanceler Celso Amorin, atual chefe de sua assessoria especial, à Ucrânia para um encontro com o presidente ucraniano Volodimir Zelenski, embora sem detalhar a mensagem que o diplomata levará ou confirmar a data.

Na segunda-feira, ele recebeu em Brasília o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, que “agradeceu” o Brasil por sua “contribuição” na busca de uma solução para o conflito e por “sua excelente compreensão da gênese dessa situação”.

Rebelo de Sousa recebeu Lula e a mulher na sede da Presidência da República, no bairro de Belém, num primeiro dia que incluiu também um encontro entre representantes dos dois governos.

Segundo o presidente brasileiro, esta visita marca também o relançamento do diálogo bilateral e uma oportunidade de ampliar as relações econômicas e sociais entre os dois países.

“Temos um potencial extraordinário para dobrar o fluxo de comércio exterior entre nossos países. Podemos ser mais ousados. Que falem mais nossos empresários e ministros”, disse Lula, que também buscará acelerar as negociações para a assinatura do acordo comercial entre a UE e o Mercosul, segundo o Itamaraty.

O ex-metalúrgico, que governou o Brasil de 2003 a 2010, quer recolocar seu país no centro da geopolítica mundial após o isolamento diplomático que marcou o governo de seu antecessor.

Nesta cimeira luso-brasileira, a primeira em sete anos, serão assinados uma dezena de acordos bilaterais, principalmente nos sectores da energia, ciência, educação e turismo.

Na segunda-feira, após encontro com empresários próximo à zona norte do Porto, Lula participará da entrega da mais alta distinção da literatura de língua portuguesa, o Prêmio Camões, ao famoso cantor e autor brasileiro Chico Buarque.

Este artista, conhecido por seu compromisso com a esquerda e contra a ditadura militar brasileira (1964-1985), havia sido anunciado como vencedor em 2019, mas Bolsonaro se recusou a assinar os documentos necessários para que o prêmio fosse oficialmente concedido a ele.

Antes de embarcar para Madri na terça-feira, segunda e última etapa da viagem, Lula fará um discurso perante o Parlamento português antes das comemorações dos 49 anos da Revolução dos Cravos, que pôs fim a 48 anos de ditadura de direita e 13 anos das guerras coloniais do país europeu na África. (Telam)

Calvin Clayton

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